Uma conta que parece não fechar. De um lado, um déficit nacional de cerca de 235 mil professores, segundo projeção do Conselho Nacional de Educação (CNE), para suprir as necessidades de contratação da área, especialmente para o ensino médio. Na outra ponta, salas de aulas com pouquíssimos alunos na graduação das licenciaturas, menos professores formados, menos mão-de-obra. Essa é uma realidade brasileira e, em Sorocaba, não é difícil encontrar o reflexo deste cenário nacional.
Na Universidade de Sorocaba (Uniso), uma das instituições de ensino da cidade com tradição na formação de professores, poucos são os alunos que ainda resistem e se formam nos cursos que têm como foco principal a preparação para a sala de aula: Pedagogia, Química, Física, Matemática, História e Filosofia. Entre eles, um dos com menor procura - e número de formados - é Física, criado pela instituição em 2005. E a necessidade do Brasil por estes profissionais não é pequena. Segundo o pró-reitor acadêmico da universidade, professor José Martins de Oliveira Junior, o déficit nesta área beirava os 50 mil profissionais há três anos.
"De lá para cá imagino que nada mudou. Acredito, inclusive, que a situação foi agravada. A procura nunca foi muito grande para esta área, mas de 20 anos para cá piorou muito." Na universidade sorocabana, o curso chegou a ter 45 inscritos em sua primeira turma. Mas no ano passado, apenas dez novos professores foram colocados no mercado de trabalho. Na opinião de Martins, é impossível virar esse jogo se as condições de carreira no Brasil - especialmente dos docentes de ensino médio, público - não melhorarem.
"Não aumentará a formação e nem o interesse por esta área se os salários não aumentarem. A defasagem é grande e, hoje em dia, se os salários triplicassem, ainda assim estariam baixos. E, por causa disso, mesmo que o governo concedesse bolsas para todos que desejam frequentar as licenciaturas, creio que a procura seria baixa." O reflexo dessa realidade os docentes percebem no dia-a-dia da graduação. No caso da Física, os poucos que frequentam querem seguir a carreira acadêmica - porém, não no ensino público, como o Brasil precisa, mas nas áreas de pesquisa e até de docência no ensino superior. Para o pró-reitor, a questão da valorização profissional, entretanto, tem reflexos que vão além da satisfação pessoal. "Professores bem preparados e motivados também motivam os alunos a gostar da disciplina. E é isso que ajudará a fazer com que gostem e pensem em ser professor no futuro."
Enquanto a totalidade dos alunos de Física - apesar de poucos - tem como destino a sala de aula, a baixa procura pelas licenciaturas tem um impacto ainda forte no curso de Química. Isso porque, nesta área, os recém-formados são atraídos pelas vagas na indústria, que paga até o dobro do que é oferecido para estar à frente de uma classe. Em 2010, foram 27 os formados pela Uniso - apenas metade optou pelo magistério. "Isso de uma turma que começou com cerca de 50 matriculados", aponta o coordenador do curso, professor André Kimura Okamoto. O número de novos professores da disciplina lançados no mercado de trabalho, em Sorocaba, diminui ainda mais se considerado o fato de que parte deles mora em cidade da região. "E acabam ficando nestes municípios, porque é mais fácil conseguir as aulas." Para Okamoto, na falta de interesse pela graduação, o salário é só um detalhe. "Muita gente pensa que é fácil, mas são cursos pesados, que exigem um grau de raciocínio abstrato que nem sempre o s alunos adquirem antes de chegar à faculdade. Por isso, as desistências são muitas."
Muito trabalho
Enquanto para alguns a carreira de professor de Química parece estar desaparecendo, para outros é o achado de uma oportunidade no mercado. Isso porque, segundo os professores da Uniso, se formar numa dessas licenciaturas, com pouca concorrência para ingresso na universidade, significa a certeza de ter um emprego - mesmo que a remuneração não seja tão boa assim.
Ariana Apolinário Okaeda, 25 anos, é um exemplo disso. Há três anos ela já deveria ter terminado a graduação, mas não consegue finalizar as disciplinas porque não tem tempo disponível, em razão da quantidade de aulas que já tem sob sua responsabilidade, na rede estadual. "No começo ia até para outras cidades, como Salto, Salto de Pirapora, Itu e Piedade. Como em alguns locais os cursos eram à tarde, chegava a trabalhar o dia todo." Hoje Ariana concentrou sua atuação só no período da manhã, mas não por falta de oportunidades. "Estou com uma filha pequena e não dá para trabalhar mais neste momento."
Ariana diz que dá para compensar os salários não tão altos quanto gostaria - "o problema é que eles não valem todo o estresse que se passa em sala de aula" - com a sensação de que, assim que ela quiser, poderá novamente aumentar o número de aulas. Isso porque grande parte das escolas, seja da rede particular ou pública, está em busca de um bom professor de Química. "Tenho a certeza de que terei trabalho. No começo a gente não sabe onde ir, com quem falar, onde procurar. E no início do ano é mais complicado. Mas os meses vão passando, os professores vão saindo, tirando licença, e as vagas começam a aparecer." Ela foi uma das estudantes que começaram a licenciatura em 2006 e que persistiu no objetivo de se tornar professora. "Começaram 70, mas se formaram só uns 30. Agora estou até fazendo Pedagogia para aumentar o leque de possibilidades no mercado. Está valendo a pena."
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